Se for sortuda o
bastante, a criança pode reaparecer na rua como em um passe de mágica, confusa
sobre seus paradeiros ou sobre quem a pegou. Todas elas descrevem o mesmo rosto.
O rosto é desfigurado, olhos vermelhos e pelagem preta, eles o descrevem como
um demônio. Esse demônio os leva por uma porta que se abre dentro de seus
armários que dá ao inferno, vária de criança a criança. Ele pode lhes mostra o
seu maior medo, seja escuro, cobras, à até mesmo pessoas mortas. Pode ser
inclusive a pessoa que você mais ama.
Mentes infantis eram
em seu todo amáveis, entretanto profundas com toda a imaginação fértil que tinham. Crianças eram verdadeiros criadores de universos e de novos seres. Poucos adultos tinham esse dom, apenas os artistas com almas sensíveis e feridas.
-Mãe!- O pequeno Michael
gritou assustado depois de um pesadelo, ao perceber que seu quarto estava
tomado por sombras.
Ele ouviu passos
apressados vindo em direção ao seu quarto. Sua mãe abriu a porta e a luz do
corredor iluminou o ambiente o fazendo proteger seus olhos com as mãos.
-O que foi?- a mãe
indagou sonolenta. -Teve outro pesadelo?
Era comum Michael ter
pesadelo com vozes que diziam querer leva-lo, ele sempre dormia com a luz
ligada e quando a mãe tentando desliga-lo, ele acordava no meio da noite
gritando. Ela não sabia o que a fazia ainda tentar apaga-las.
-Foi!- Michael estava
esgotado, seu corpo não aguentava mais toda essa privação de sono. Ele dormia
na sala de aula, não conseguia comer direito e tudo o lembrava dos sonhos
ruins. As vozes pareciam segui-lo, e nada adiantava contra isso. A mãe até tinha
o levado ao psicólogo que disse que ele era uma criança normal que precisava de
mais atenção.
O problema é que
Michael tinha atenção. Até demais.
-Querido, quer tomar
remédios novamente?- a mãe perguntou tentando soar calma, ela sabia que
calmantes o fariam dormir, mas Michael não gostava de remédios, dizia que o
deixavam com o raciocínio mais lento do que quando não dormia.
-Não precisa mãe, eu
volto a dormir por conta própria- ele acalmou a mãe e se cobriu mais com seu
cobertor azul.
- Está bem, qualquer
coisa é só me chamar.
-Deixa a luz ligada!-
Michael gritou assim que a mãe passou pela porta ligando a luz de seu quarto.
Ele suspirou aliviado e a mãe fechou a sua porta.
Michael rolou de um
lado pro outro na cama e não conseguia dormir. Ele ouviu um barulho no seu
armário e se encolheu de medo.
-Vá embora!- ele
estava aterrorizado, sabia que era algo ruim ali dentro.
As luzes começaram a
piscar e Michael ouviu um barulho em sua porta.
-MÃE!- ele gritou com
toda energia que tinha e sabia que o bicho dos seus pesadelos estava querendo
leva-lo.
Uma vez seu amigo da
igreja descreveu o inferno para ele após dizer que se comportava mal e iria
para lá quando morresse. Descreveu o cheio de enxofre e ovos podres. Disse que era
um lugar escuro, coberto de lama e fogo, com pessoas gritando a todo o momento
em meio à dor.
Era exatamente este
cheiro que infiltrou seu quarto.
Foi ai que soube, ele
voltou para busca-lo.
As luzes se apagaram
de uma só vez e o menino só ouviu seu coração batendo fortemente. A porta do
seu armário se abriu e ele olhou com pavor uma sombra rastejar até onde ele
estava.
Michel começou a
gritar, gritos agonizantes de puro desespero. Sua mãe se levantou assustada
assim que escutou de seu próprio quarto seu filho aterrorizado com algo. Correndo
até o quarto de Michael, tentou abrir sua porta, mas estava fechada e ela bateu
os punhos contra a porta, mas de nada adiantou, ela entrou em desespero.
Michel ouvia a sua
mãe atrás da porta, mas não conseguia abri-lo.
O bicho ainda
rastejava deixando um rastro de sangue e lama no chão por onde passava. Em um
piscar de olhos, o demônio tinha sobre seu agarre firme os tornozelos do menino
Michael com suas mãos. Seu aperto era tão forte que conseguiu arrastar o garoto
em esforço para fora de sua cama e logo para o chão.
Michael gritou
agoniado quando caiu e bateu à cabeça no piso, ficando confuso por um instante
devido à queda. Colocou suas unhas no chão com força enquanto o bicho o
arrastava e seus dedos ficaram feridos e seu sangue se espalhava pelo piso,
tanto o do tornozelo quanto o da sua unha.
Suas unhas se
soltavam da carne enquanto tentando se manter onde estava e gritava de dor enquanto
o bicho continuava a arrasta-lo até o armário. Michel observava uma porta
parecendo um buraco negro dentro do seu armário. Era tudo escuro, Michel tinha
medo do escuro.
O bicho o arrastou
até lá e o jogou no seu próprio inferno para testa-lo, se ele tivesse medo ele
morreria, se ele superasse, poderia viver.
Michel olhou pela
última vez o bicho.
Olhos vermelhos,
dentes afiados como agulhas, rosto desfigurado com o que parecia cicatrizes grossas
e grotescas, além de sua pelagem preta grossa.
Michael fechou os
olhos e quando o abriu nada conseguiu enxergar. Desesperou-se e recomeçou a
gritar. Tinha esperanças de que alguém o ouvisse.
A porta de seu quarto
abriu e quando sua mãe entrou a sua procurar chamando seu nome, não conteve seu
desespero e berros com o que viu: o quarto do garoto estava banhado de sangue e
no piso arranhões e resto do que pareciam unhas do menino.
- Ai meu Deus, meu
filho!- a mulher chorava inconsolavelmente tentando encontra-lo inutilmente.
Não conseguia enxergar o portal no guarda-roupa, sua visão era a de um
guarda-roupa normal cheia de roupas amassadas.
Michel por outro lado
procurava cegamente sair daquele lugar onde o monstro brincava com sua mente.
Um, dois, três... um,
dois, Três.
O monstro cantava com
voz cavernosa repetidamente de modo incansável. Seu desespero, sua dor e medo o
alimentavam.
Um, dois, três... um,
dois, três.
-Deixe-me em paz!-
Ele chorava fortemente em meio aos soluços.
-Eu quero minha mãe-
Ele fez o que toda criança faria, pediria a sua mãe porque sempre significava
segurança.
-Seu mãe não existe
mais, ela morreu- disse o mostro
ironicamente, ele estava deliciado com a descoberta de outra fraqueza humana. –Pobre
garoto órfão.
-Não morreu nada- A voz do menino era puro pavor, a palavra lhe saiu amarga. –Eu a vi hoje.
As luzes se acenderam
e os olhos do menino arderam com a intrusão de cores. Em sua frente estava sua
mãe e ele lutou contra a vontade de abraça-la. Algo estava errado, ele sentia
isso.
Sua mãe possuía uma
tesoura, e deu uma risada maníaca quando ergueu a tesoura e a passou a lamina
em seu pescoço agressivamente. Um corte profundo se formou e a cabeça se
pendurou frouxa enquanto o sangue espirrava por todo o piso branco. A poça escorreu
rapidamente até o pé do menino e uma frase se formou. MORTA!
Em choque, as pernas
do menino tremeram ao ponto de não manter o equilíbrio no mesmo momento em que
um liquido quente escorreu em suas pernas. Estava tão horrorizado que havia
feito xixi. Deitado agora ao chão, colocou a cabeça entre seus joelhos,
silenciosamente suas lágrimas escorriam, ele não sentia nada, só frio. Sua
mente em forma de proteção começou a ficar confusa, ele não tinha pensamentos
coerentes e ele repetiu a si mesmo que não era real.
Não
é real, não é real, não é real...
Havia visto sua mãe
hoje, ela nunca estaria aqui. Estava bem, em sua casa e o monstro estava
brincando com sua mente. Ele não deveria entretê-lo mais.
Vá
embora, não tenho medo de você!- Vociferou alto em
sua mente.
Fechou os olhos
durante a repetição da frase em sua mente e quando os abriu, estava em seu
quarto novamente. Todo o local continha faixas amarela que ele reconheceu ter
visto em filmes policias em cenas de crimes. Ainda tinha sangue sobre o chão e
lama.
-MÃE!- Gritou
chorando. Não queria acreditar que sua mãe estava realmente morta.
-Filho!- a voz da mãe
sentada em uma cadeira no canto mais escuro do quarto. Ele olhou e ali estava
ela. Não perderam tempo correndo um para o outro.
-Você estava morta e
ele queria me levar- ele repetia lembrando-se de tudo.
Um, dois, três... um, dois, três.
Um, dois, três... um, dois, três.
Um, dois, três... um, dois, três.
Cinco
meses depois.
-Ele está obtendo melhora?-
a mãe de Michel olhava pelo vidro da porta seu filho se debatendo e gritando
números em uma contagem sem fim.
-Não tivemos uma
melhora, mas o lado bom é que também não se foi alcançada uma piora. Ao
tentarmos fazer teste com luzes ele ainda grita e começa a se machucar- O psiquiatra
disse olhando pelo mesmo vidro que a mãe da criança. –A senhora vai mesmo
autorizar os testes? Precisamos assegurar ao Michael que nada do que viu era real, que seu medo é criação de sua mente.
-Se for pelo seu bem,
eu autorizo- A voz dela era de dor, ela queria seu filhinho de volta.
Houve um tempo em que
seu filho foi uma criança normal, brincava, ia a escola, dava risada e sorria.
Tinha um tempo desde que o vi fazer algo assim. Ele não sorria mais e parecia
sempre desconfiado, agressivo.
Ela assinou os papéis
sentindo uma dor sobre seu coração e apertou o peito com a mão. Eles prenderam
seu filho Michael, de apenas sete anos de idade, em uma camisa de força para
que não se machucassem, colocaram uma sala enquanto Michael ainda fazia.
-Está pronta?- Perguntou
o psiquiatra a mãe de Michael.
-Sim- Ela respondeu sabendo
que mentia. Nem em um milhão de anos estaria preparada para ver seu filho em
uma camisa de forças.
Eles desligaram as
luzes da sala de Michael e instantaneamente começou a berrar.
Um odor de ovos
podres invadiu o local e Michael se calou. A mãe estranhou o silencio assim
como os profissionais presentes no local.
Michael ainda estava
parado sentindo a presença da besta quando algo segurou sua perna fazendo-o
gemer de dor.
Encontramos-nos
de novo Michael, só que dessa vez sua alma me pertence. O
monstro lhe disse com a voz extremamente grossa e controlada. Era perversa, de
gelar a espinha de alguém.
Quando voltou a
gritar novamente, a mãe começou a dizer para soltarem seu filho dali e ligarem
a luz. Apesar de suas solicitações, ao tentar ligar as luzes houve uma falha
mecânica.
-Não tem como ligar
as luzes daqui, só pelo lado de dentro- Uma enfermeira avisou.
-Então façam isso,
liguem por dentro.
-Deus, essa sala está
com um cheiro tão estranho- O enfermeiro que entrou reclamou e não conseguiu
acender a luz por dentro. Teve receio um segundo que Michael pudesse agredi-lo,
mas ele era apenas um menino magricela que estava preso a uma camisa de força e a
uma cadeira.
Jurou sentir um arrepio passar por seu pescoço até seu couro cabeludo como se sentisse a presença de algo maligno ali.
Um,
dois, TRÊS- o monstro gritou novamente arrastando Michael a
uma porta que se abriu na parede. Outras pessoas estavam lá daquela vez, todas
berravam e se encontravam em chamas. Era o inferno, desta vez tinha certeza.
Antes que pudesse
sentir medo, tudo ficou escuro. Sentiu um sorriso escorrer e congelar em seu rosto.
Sua alma não lhe
pertencia mais!
FIM
Não sei se perceberão, mas coloquei a cidade dos desastres de Resident Evil! Espero que apreciem a leitura ♥